Na segunda-feira (27), o Ministério Público da Bahia (MP-BA) promoveu uma audiência pública que contou com a presença de entidades civis, especialistas em cultura e direitos humanos, além do público em geral, para debater a proteção às religiões de origem africana. Após a controvérsia com a cantora Claudia Leitte, que alterou a letra da canção 'Caranguejo', substituindo Iemanjá por Yeshua, o ato foi marcado. A mudança desagradou membros de religiões afro-brasileiras e foi motivo de protestos nos discursos proferidos pelos oradores.
Samuel Vida, coordenador do Programa Direito e Relações Raciais da Universidade Federal da Bahia (Ufba), deu início à audiência, enfatizando a relevância de desvincular o racismo de indivíduos maus ou como um comportamento derivado de uma condição patológica. Não é isso que caracteriza o racismo. "Trata-se de um fenômeno bastante complexo que precisa ser levado a sério", afirmou.
"Trata-se de um fenômeno que se manifesta em áreas difusas, transversais e generalizadas em todas as esferas das interações sociais, incluindo o espaço microssocial mais relevante, a família. O fenômeno se estende, portanto, por toda a estrutura social, afetando as instituições e orientando o funcionamento das instituições estatais", concluiu.
"Trata-se de uma chance de progresso na compreensão do racismo e da demanda por respostas estruturadas em uma perspectiva diferente, que sejam concebidas como mudanças capazes de gerar novos padrões civilizatórios para a nação, novos fundamentos para as interações sociais, novos processos de interação em um cenário sempre caracterizado pela diversidade: a sociedade", enfatizou o especialista.
Entre os oradores inscritos para falar no púlpito, o líder quilombola Jurandir Pacífico, filho de Mãe Bernadete Pacífico, brutalmente assassinado em agosto de 2023, foi o primeiro a mencionar diretamente a controvérsia que envolveu Claudia Leitte. Ele chegou a substituir o nome de Deus por Oxalá em uma canção gospel para fazer uma comparação.
"E se eu chegar à igreja com a canção 'Toda a terra louva a Ti, no cântico de júbilo, pois és o Deus criador' e alterar para 'Toda a terra louva a Ti, no cântico de júbilo, Oxalá, o criador' , o pastor vai gostar?" Coloque-se na posição do irmão. Trata-se de um preço bíblico: "ame o próximo". Por que você não respeita os outros? Jurandir pediu respeito ao povo de santo e ao de axé.
Jaciara Ribeiro, uma ialorixá e ativista cultural que combate a intolerância religiosa no Brasil, afirmou que o movimento decorrente da alteração da letra da canção não é pessoal ou isolado. Ela é uma das autoras da denúncia e afirmou que viu na troca um ato de continuidade da violência. “Substituir uma palavra que simboliza um orixá é falar sobre o que ocorre em nossas comunidades com os saqueadores de terreiros e a perda de memória”, afirmou.
"Isso adoece nosso povo, pois o racismo e a intolerância religiosa provocam a morte." Não apenas por ter vivenciado a perda de Mãe Gilda, mas também porque tenho contato com terreiros que perderam a autoestima. Conheço crianças que não recebem mais frequentar a escola comendo comida de terreiro como lanche, pois se a professora é evangélica, ela quer satanizar até o alimento. .::. "Estou convencido de que Iemanjá não está contente", concluiu.
Fonte: Correio da Bahia
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